sexta-feira, 9 de maio de 2014

Travessa do Comércio

Há uns dois posts atrás, eu escrevi que a Praça XV no Rio de Janeiro era aonde tudo acontecia no tempo da família real. Uma região badalada. Devia ser uma vizinhança interessante. Mas é difícil saber, porque o progresso tem esta personalidade destruidora. Vez ou outra, ele fica benevolente, e poupa umas ruelinhas. Que eu costumo chamar de relíquias.

Ali na própria Praça XV tem uma passagem "secreta" pra uma destas. É o Arco do Telles datado de 1730, que faz entrada para a Travessa do Comércio. Um verdadeiro Delorean que leva a gente diretinho pro período colonial: ruelas estreitas apenas para pedestres, paredes assobradadas, luminárias em arcos, arquitetura portuguesa, mini igrejas uma do lado da outra... e personagens lendárias.



Bárbara dos Prazeres, uma portuguesinha serelepe, chegou ao Brasil com 18 anos e aos 20 já tinha matado dois maridos. Porque um é pouco, dois é bom. Resolveu se dedicar ao dom da prostituição e escolheu como ponto o Arco do Telles. Os negócios iam bem, a demanda era vasta, o custo/benefício compensava. Só que o tempo não perdoa, a gravidade derruba tudo, e prostitutas, assim como jogadores de futebol, tem prazo de validade. Bárbara que já não batia bem, não se conformou, e na falta de cirurgiões plásticos, foi a caça de feiticeiros que pudessem lhe trazer de volta a beleza e a juventude. A prescrição dada foi muito simples: sangue fresco de criança morta. A venda nas farmácias e drogarias, só que não. Então que Bárbara virou serial killer de criancinhas. Raptava crianças pobres ou retirava bebês orfãos deixados em frente aos conventos. Ninguém sabe quantas crianças ela matou, nem o que lhe aconteceu depois. Ela simplesmente desapareceu... vush. E a história é tão real, que tem até registros na polícia.

Filosófo do Cais, foi um louquinho destes que andam pelas ruas falando nada com nada, mas que a gente conhece bem por estarem sempre nos mesmos lugares. São praticamente pontos de referência. "Vira ali a esquerda, depois do louquinho". Pois, este louquinho, chamado João Alberto Matias, jurava que era alemão e se intitulava "Barão de Schindler". Andava sempre de fraque verde, descalço, com um cachimbo na boca e um boné alto de penas verdes. Dizem, tinha lutado nas Guerras Napoleônicas. Pode muito bem ser. Fato é que um dia ele surtou de vez e foi levado pro pinel.


Carmem Miranda (deixei esta por último, pro post ter final feliz), a pequena notável, passou parte da adolescência no sobrado número 13 da Travessa do Comércio, aonde sua mãe dirigia uma pensão. Foi ali que ela foi "descoberta". Carmem Miranda, pra quem não sabe, fez carreira internacional com abacaxis na cabeça (praticamente uma zungueira), mas antes disso já era a cantora mais bem paga da cena brasileira, tinha atuado em cinco filmes nacionais e era a estrela principal do Cassino da Urca. Em 1945 também foi considerada a artista mais bem paga de Hollywood. Hoje, na Travessa do Comércio tem um karaokê com o seu nome! Ô, ironia!

Essa na foto não é a Carmem Miranda. É a Rita, que
acho eu, não vai ficar braba de aparecer no meu blog. 

Tudo isso e muito mais passou-se na Travessa do Comércio. Hoje o que acontece são passeios gostosíssimos com direitos a paradas em bares e restaurantes, muita música ao vivo e cervejinha. Tô recomendando.

4 comentários:

  1. A Travessa do Comércio faz parte da história de grande parte dos cariocas da minha idade. E foi na Praça XV que surgiu o primeiro e inigualável Angu do gomes, costume culinário da minha terra que puxa o trem da saudade.

    :)

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  2. Que delícia de roteiro! Amei a ilustração da "Metal Carmem".
    Bjk.

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    1. É de um ilustrador brasileiro chamado Will Murray (o nome não é brasileiro, eu sei... heheh).

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